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Microestruturas dos aços mola para aplicação automotiva

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Davinson Mariano da Silva

Agradecemos ao Prof. Dr. Silvano Leal dos Santos pela contribuição dessa semana!

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A maioria dos aços molas pertence à família dos aços hipoeutetóides, sendo amplamente utilizados na indústria automotiva (Fig. 1), geralmente passam por processo de laminação à quente e tratamento térmico, resultando numa microestrutura bem heterogênea (Fig. 2).

 

 

Figura 1 –  Propriedades e aplicações dos aços mola  (Santos, 2018).

 

A microestrutura dos aços em seu estado como recebimento é constituída por microconstituintes como ferrita e perlita, esta última formada pelas fases ferrita e cementita lamelares. No entanto, havendo alta taxa de resfriamento a partir do campo austenítico ocorrerá o surgimento de outros microconstituintes como bainita e martensita (Bhadeshia, 2001). O processo de tratamento térmico de têmpera em taxas rápidas de resfriamento promove a formação de microestrutura com predomínio de martensita. Portanto, se o processo de têmpera ocorrer de forma incompleta à microestrutura característica apresentará uma mistura heterogênea constituída em martensita, austenita retida, ferrita e perlita ou bainita (Yamada, 2007). A austenita que não se transformou durante o processo de têmpera, ou seja, não ocorreu transformação da austenita em martensita é chamada de austenita retida.

 

 

Figura 2 – Etapa do processo de tratamento térmico do aço mola SAE 9254 (Santos, 2018).

 

A fração de transformação da martensita depende de vários fatores, como composição química do aço (principalmente quanto ao teor de carbono, já que o mesmo atua fortemente na estabilização da austenita), temperaturas de início e de final de formação da martensita (MS e MF) e cinética de decomposição da austenita (que concorrerá com a transformação martensítica) (Grajcar, 2010). Segundo (Hattori, 2012), as formações das microestruturas dos aços dependem necessariamente de como a liga será aquecida e resfriada, o que também vale para a formação da microestrutura do aço SAE 9254. A presença de ferro, carbono e alguns elementos de liga (Cr, Si, Mn e Ni) na composição dos aços mola favorecem a formação de microestruturas com diferentes microconstituintes. Nos aços carbono hipoeutetóides, com microestruturas prévias compostas por ferrita (CCC) e perlita (lamelas de ferrita e cementita), a formação dos primeiros núcleos de austenita (com estrutura cristalina CFC) durante o aquecimento ocorre preferencialmente em regiões de contornos de grãos da ferrita e com a elevação da temperatura o equilíbrio termodinâmico da austenita é favorecido. Nos aços com estrutura perlitica esferoidizada, os núcleos de austenita são formados próximo aos carbonetos distribuídos ao longo dos contornos de grãos de ferrita. O crescimento do núcleo de austenita pode ocorrer por duas maneiras. Na primeira, o grão de austenita, encontra-se na interface entre ferrita e cementita, as quais são consumidas pelo crescimento espontâneo do grão de austenita. Na segunda, o grão de austenita é completamente cercado de ferrita pró eutetoide, enquanto a interface austenita/ferrita não atinge a cementita (Oliveira et al., 2007).

Para formação de austenita, é necessário um tempo de incubação para que os primeiros núcleos desta fase possam ser formados; em seguida a transformação de fase prossegue a uma taxa mais rápida à medida que mais núcleos se desenvolvem e crescem. Em temperaturas maiores, a taxa de difusão do carbono aumenta e a formação da austenita ocorre mais rapidamente. A velocidade de crescimento isotérmico do grão de austenita é controlada pela difusão de carbono, desde a interface “austenita/cementita” para a interface “austenita/ferrita”. A difusão de nivelamento reduz a concentração de carbono na interface “austenita/cementita”, tornando a austenita supersaturada em carbono em relação à cementita, a qual se solubiliza. Na interface com a ferrita, a difusão de nivelamento aumenta a concentração de carbono na austenita. Desta forma, a austenita fica supersaturada em relação à ferrita, a qual se transforma em austenita. Sendo assim, o grão de austenita cresce do lado da ferrita e cementita (Novikov, 1994). A influência do tempo e temperatura de austenitização em um aço hipoeutetóide durante tratamento térmico é representada por curvas na Fig. 3 (a-b).

 

Figura 3 – Fração de austenita formada em um aço perlítico hipoeutetóide em função (a) do tempo (b) da temperatura (Krauss, 2015).

 

Um aquecimento no processo de têmpera sob um determinado tempo é um requisito básico fundamental empregado nos tratamentos térmicos, em especial aos aços hipoeutetóides que visa dissolver o máximo possível de fases livres presentes nas microestruturas. Para atingir a temperatura de têmpera, a mesma dever permanecer acima da linha A3 (linha GS) do sistema binário do diagrama Fe-C, conforme Figura 4. O limite superior do intervalo de temperaturas para evitar superaquecimento é definido abaixo do ponto solidus da liga. Importante ressaltar que o superaquecimento pode ocasionar formação de óxidos, bolhas gasosas e descarbonetação. Caso os elementos de liga presentes na composição química do aço supere o limite de solubilidade, o estado monofásico da liga torna uma meta difícil a ser alcançada. Desta maneira, a temperatura de aquecimento de têmpera é escolhida a mais próxima possível da temperatura eutética (Bhadeshia, 2006).

 

 

Figura 4 – Diagrama de equilíbrio Ferro-Carbono (Bhadeshia, 2006).

 

Em um estudo dilatométrico em aço mola SAE 9154 submetido em diferentes taxas de resfriamento contínuo de 0,5oC a 40oC a austenita decompõe em outros microconstituintes, como ferrita, perlita, martensita e também bainita, conforme apresentado nas Fig. (5 a 7).

 

 

Figura 5 – Imagens de MCVL das amostras tratadas termicamente sob taxas de resfriamento de (a) 0,5oC/s (b) 1,0oC/s.

 

 

Figura 6 –  Imagens de MCVL das amostras tratadas termicamente sob taxas de resfriamento de (a) 0,5oC/s (b) 1,0oC/s.

 

 

Figura 7 – Imagens de MCVL das amostras tratadas sob taxas de resfriamento (a) 10oC/s (b) 20oC/s (c) 40oC/s.

 

 

Referência Bibliográfica

BHADESHIA, H.K.D.H. Bainite in steels, transformations, microstructure and properties, second edition, Cambridge, UK, 2001. 478 p.

BHADESHIA, H.K.D.H; HONEYCOMBE, R. Steels Microstructure and Properties, Third edition, Oxford,UK, 2006. 357 p.

GRAJCAR, A. Morphological features of retained austenite in thermo-mechanically processed C-Mn-Si-Al-Nb-Ti multiphase steel, Journal of Achievements in Materials and Manufacturing Engineering, v. 39, issue 1, 2010.

HATTORI, C. S. Comparação de Molas de Suspensão Temperadas, Revenidas e Enroladas a Quente e a Frio; 2012, 98 f.. Dissertação (Mestrado em engenharia mecânica) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, SP, 2012.

KRAUSS, G. Steels: Processing, Structure, and Performance, 2rd Edition, ASM International, 704 p.  2015.

NOVIKV, I.  Teoria dos Tratamentos Térmicos dos Metais, Editora UFRJ, 550 p. 1994.

YAMADA, Y. Materials for spring, japan society lecturer, Setsunan Univ. of Spring Engineers (jsse), 540p., 2007

Santos,S.L. Influência dos Parâmetros de Tratamento Térmico e Termomecânico na Microestrutura e Propriedades Mecânicas do Aço-Mola SAE 9254, 2018,155 f. Tese. Universidade Federal do ABC, São Paulo, 2018.