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Materiais Semicondutores: Parte 2

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Davinson Mariano da Silva

Olá Pessoal!

 

Há algumas semanas publicamos um artigo sobre materiais semicondutores. (Leia aqui). Mas com certeza esse é um assunto que não cabe em um só artigo. Os materiais semicondutores são diferentes dos materiais condutores ou isolantes. Mas para um melhor entendimento  sobre esses materiais e o porque eles são a base de todos os dispositivos eletrônicos, resolvemos dar continuidade nessa discussão.

 

 

Vamos começar falando um pouco do transporte de cargas em um material semicondutor. Lembrando do artigo anterior, os semicondutores podem existir em sua versão mais “pura”, os chamados Semicondutores Intrínsecos. Eles também podem ser dopados de propósito para atuarem como Semicondutores Extrínsecos Tipo P ou Tipo N.  Mas qual a real diferença entre esses materiais? Por que fazer dopagem? O material “puro” não deveria ser melhor?

 

 

Imaginamos um Semicondutor Intrínseco (“puro”). Vou usar o silício aqui nos exemplos. Mas existem muitos outros materiais semicondutores, como o germânio e o arseneto de gálio, por exemplo. Se estivermos no zero absoluto (sim, 0 K ou -273, 15ºC, bem frio!!), não há elétrons livres no Semicondutor intrínseco. Mas, à medida que o material é aquecido, parte da energia térmica é transferida para o material e portadores de carga são gerados.

 

 

Portadores de carga? Os elétrons são portadores de carga elétrica negativa. Prótons são portadores de carga positiva (mas eles estão nos núcleos dos átomos e não podem sair de lá, a menos que MUITA energia seja fornecida, tipo a energia envolvida em uma explosão nuclear – o que não queremos, rs).

 

 

Acontece que o elétron, ao se “libertar” de sua ligação química, deixa para trás uma lacuna ou um buraco. Esse buraco representa a ausência de um elétron e, portanto, pode ser pensado como uma “entidade” cuja carga é positiva. Os principais portadores de carga nos semicondutores são elétrons e buracos. E ambos se movem. Veja as Figuras abaixo:

 

Figura 1 – Diagrama ilustrativo mostrando o movimento de um elétron.

 

 

 

Figura 2 – Diagrama ilustrativo mostrando o movimento de uma lacuna (à direita). Veja como a ideia de lacuna faz muito mais sentido quando temos muitos elétrons no material. No fundo as lacunas são uma forma simplificada de visualizar a movimentação de cargas num material com muitos elétrons. Pense na lacuna como uma partícula carregada positivamente, com carga idêntica à do elétron.

 

 

É importante salientar que para libertar um elétron dentro do semicondutor, não adianta fornecer qualquer quantidade de energia. É necessário que seja fornecido um valor mínimo de energia para que o elétron vença as interações eletrostáticas que o prendem na rede (no silício, os elétrons estão sendo compartilhados em ligações covalentes, entre os átomos de silício). Esse valor mínimo de energia é chamado de energia de banda proibida ou energia de band gap do material. Para entender melhor isso, veja o diagrama abaixo.

 

 

 

Figura 3 – Representação esquemática de um Diagrama de Energias de um Material Semicondutor.

 

 

Veja que o diagrama de energias é composto por uma banda de valência e uma banda de condução, com um espaço (um “gap” de energias) entre elas. O entendimento completo desse diagrama envolve um pouco de física quântica e física do estado sólido. Mas vamos facilitar as coisas por aqui.

 

 

Cada uma das bandas de energia pode estar povoada por portadores de cargas. No zero absoluto, por exemplo, a banda de valência é povoada por elétrons. A banda de condução está completamente vazia. Você pode imaginar que todos os elétrons no material estão ligados às camadas de valência dos átomos de silício, participando das ligações covalentes. Você lembra que os elétrons das últimas camadas dos átomos são elétrons de valência (ou elétrons das camadas de valência, se preferir assim, rs)?

 

 

Enquanto o elétron estiver na camada de valência dos átomos, ele não pode participar da condução elétrica. Ele precisa estar livre na estrutura para se mover na rede. Isso só é possível se fornecermos a energia necessária para esse elétron se desprender de sua ligação química e estar livre para poder participar da condução elétrica (ou, em outras palavras, esse elétron deixa a banda de valência e passa a povoar a banda de condução). Mas para que isso aconteça, é preciso fornecer ao material a energia de band gap.

 

 

Isso não precisa ser feito apenas com calor. Qualquer forma de energia pode ser utilizada para libertar elétrons na estrutura de um semicondutor. De fato, sensores já usam esse conceito simples para funcionar. Um termistor, por exemplo, é um semicondutor no qual a condutividade elétrica é proporcional à temperatura do meio. Uma fotocélula (ou LDR, de light dependente resistor ou resistor dependente de luz) é um sensor óptico. Quando a luz é incidida na face deste sensor a resistência elétrica do componente cai, porque mais portadores de carga ficam disponíveis no material. Os termistores podem ser usados em estufas e os LDRs são muito utilizados em postes de iluminação (quando a noite chega, o LDR para de conduzir e as lâmpadas do poste se acendem).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 4 – Fotos de um Termistor (à esquerda) e de um LDR (à direita).

 

 

No silício extrínseco Tipo N existem íons pentavalentes como o fósforo. Nesse caso, um dos elétrons já está praticamente livre. Mas no zero absoluto, ele ainda fica “preso” ao fósforo (que é um íon positivo). Mas arrancar esse elétron do seu íon pai é muito mais fácil, pois ele não participa de nenhuma ligação forte (como a ligação covalente). Assim a energia necessária para arrancar esse elétron “extra” é muito menor do que a energia de band gap do semicondutor. A mesma coisa acontece para o silício extrínseco Tipo P. Só que, neste caso, há menos elétrons na rede e lacunas extras. Com um pouco de energia (muito menor que a do band gap do material), um elétron sai de uma posição próxima e passa a ocupar aquela lacuna. Mas é muito mais fácil visualizar o transporte de cargas tendo como referência o movimento das lacunas. Veja as figuras abaixo e você entenderá melhor.

Figura 5 – Transporte Elétrico em um Material semicondutor Intrínseco. A seta no diagrama indica a quantidade de energia fornecida ao material. Veja que cargas livres somente são criadas a partir do momento que a energia fornecida supera a energia de band-gap do material.  Neste momento é criado um par elétron-lacuna (também chamado de éxciton). (Obs… os elétrons gerados geralmente ficam próximos de suas lacunas, uma vez que ambas possuem cargas opostas e, portanto, há uma força de atração acontecendo a todo momento). Quando a energia externa deixa de ser fornecida, os elétrons e lacunas se recombinam e a condutividade elétrica do semicondutor volta a ficar baixa.

 

 

Figura 6 – Transporte Elétrico em um Material semicondutor extrínseco tipo N. Neste caso, os íons dopantes apresentam um elétron adicional na camada de valência. Isso gera portadores negativos de carga (elétrons) adicionais na rede do semicondutor. Geralmente eles ficam próximos do seu íon pai. Mas a energia necessária para “libertar” esses elétrons é muito menor que o valor de band-gap. Veja no diagrama que existe um nível adicional de energia no meio da banda proibida, próximo da banda de condução. Este estado de energia acomoda os elétrons extras doados pelos íons dopantes. Assim, a energia fornecida ao material pode ser menor que a energia de band-gap, para observamos elétrons livres. De fato eles só precisam de um pequeno “empurrãozinho” para se libertar das forças atrativas dos seus íons pais para participar da condução elétrica. Repare também que os íons pais são positivos (pois eles perdem elétrons para a rede). Se a energia externa, fornecida ao material, voltar a ficar muito baixa (menor que a energia de Fermi do Material), a força eletrostática de atração prevalece e os elétrons voltam para as proximidades de seus íons pais.

 

Figura 7 – Transporte Elétrico em um Material semicondutor extrínseco tipo P. Aqui, a explicação é a mesma que vimos para o semicondutor tipo N. Mas às vezes os semicondutores geram uma confusão na nossa cabeça. Na prática, os íons dopantes possuem um elétron A MENOS na camada de valência. Por isso, os íons dopantes, nesse cado, também são chamados de íons ACEITADORES. Outra forma de visualizar esse material é imaginar que os íons geram LACUNAS adicionais na rede. Se considerarmos as lacunas “partículas” positivas, elas serão muito parecidas com os elétrons. (Mas tome cuidado!! As lacunas representam apenas os “vazios” deixados pelos elétrons na rede). De qualquer forma, é possível representar a energia associada às lacunas adicionais no diagrama com um nível adicional no meio da banda proibida. Mas dessa vez, esse nível fica próximo da banda de valência do material. De qualquer forma, o “empurrãozinho” que precisamos dar para um elétron ocupar o lugar de uma lacuna é pequeno. E, se o elétron se move, a lacuna também se move! E se cargas se movem, temos a possibilidade de conduzir eletricidade por esse material também. Note que as lacunas (com cargas positivas) também voltam para seus íons-pais quando a energia fornecida é menor do que a Energia de Fermi do Material.

 

 

No diagrama de energias, é como se existissem elétrons em um nível muito próximos da banda de condução (no semicondutor Tipo N) ou lacunas muito próximas da banda de valência (no semicondutor Tipo P). Na física do estado sólido, isso tem a ver com o deslocamento da Energia de Fermi do Material. Mas vamos deixar esse assunto para outra hora…

 

 

Você percebeu uma coisa? O valor do band gap do semicondutor é muito importante, pois ele define a facilidade (ou dificuldade) em libertar cargas no material. NA verdade esse modelo pode se estender para todos os materiais. Os metais, por exemplo, têm band gap igual a zero. Isso significa não é necessário um fornecimento mínimo de energia para a condução elétrica acontecer. Os isolantes? Eles possuem energia de band gap muito mais altas do que os materiais semicondutores. Por isso, é muito difícil libertar cargas nesses materiais.

 

 

Veja abaixo uma tabela com os valores de energias de band gap para alguns materiais:

 

 

Tabela 1 – Valores de Energia de band gaps para alguns materiais. Valores de Energia de Band Gap acima de 4,0 eV (aproximadamente) são característicos de Materiais Isolantes.

Material Band gap (eV)
Nitreto de Alumínio 6.0
Diamante 5.5
Silício 1.14
Germânio 0.67
Nitreto de Gálio 3.4
Fosfeto de Gálio 2.26
Arseneto de Gálio 1.43
Nitreto de Silício 5
Sulfeto de Chumbo
(II)
0.37
Dióxido de Silício 9
Óxido de Cobre (I) 2.1

Fonte: Wikipedia.

 

 

A energia de band gap depende da composição do material e das ligações químicas presentes. Nos últimos anos, com o avanço da nanotecnologia, foi descoberto que o band gap depende também do tamanho do material! Isso mesmo. Se você fizer uma nanopartícula metálica muito pequenininha (menor do que 1 nm, lembrando que 1 nm é um metro dividido 1 bilhão de vezes!) ela vai possuir um band gap maior do que zero. Com os semicondutores acontece a mesma coisa. Isso deu origem aos pontos quânticos, que já estão sendo utilizados em televisores para iluminar a sua telinha e te proporcionar milhões de cores de diversão nas suas tardes de domingo!

Quer saber mais? Então se liga nos próximos artigos. Grande abraço!